quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Uma semana no museu

Em agosto passado tive o privilégio de trabalhar como voluntária na Viagem Medieval de Santa Maria da Feira, como vigilante e monitora do Museu Convento dos Loios (link).
Foi uma semana muito fora da normalidade e que se tornou um experiência marcante, pois as pessoas que visitaram o museu vinham de todo o país e até de países estrangeiros, pois o protagonismo da Viagem Medieval já é muito!
Apareceram pessoas de todas as idades, desde meninos e idosos que tudo apreciavam e liam ao pormenor, até àqueles que entravam apenas na tentativa de irem à casa-de-banho e acabavam por visitar todo o museu.
Apareceram também casais na casa dos 50 anos que ao descobrirem que era um museu se recusavam em visitar porque "Ah, do museu nada me interessa!" e casais de jovens namorados que aproveitavam o museu para namorar e apreciar a história de D.Sancho II.
Famílias acompanhadas de copos de sangria (pois nesta festa pode-se andar de copo em todo o lado depois de pagar a bebida e o próprio copo), que apreciam toda a exposição demorando mais de 2 horas, nunca perdendo a atenção dos mais novos.
Havia também aqueles senhores mais velhos, que entravam sem saber o que era e iam resmungando que não tinha nada. Depois da primeira sala diziam "Eu bem disse, só isto!", mas eram encaminhados para a segunda sala. Continuavam a resmungar que era pouco mas eram encaminhados logo de seguida para o 1º piso e só aí começavam a ficar contentes mas continuavam a refilar, mesmo o museu tendo entrada gratuita.
Ainda apareciam os que resmungavam ao lhes ser oferecido um vale de desconto de entrada em muitos outros locais de cultura da Feira apenas por 1€, dizendo "Claro que se paga! Já paguei 4€ para entrar e tudo cá dentro se paga!", o que não era de todo verdade, pois a entrada do museu, por exemplo, é gratuita.
Engraçados foram aqueles que entravam já alterados por tantas bebidas alcoólicas que ingeriram, de tal forma que falavam com todos os quadros como se de amigos imaginários se tratassem. Melhor ficava ainda quando apareciam vindos de excursões com chapéus idênticos aos do boneco do Zé Povinho e também com nariz e bochechas vermelhas.
As conversas mais longas eram com visitantes da terra, que tinham conhecido o museu ainda como tribunal e elogiavam muito o trabalho feito, recordando algumas situações ali passadas.
Tentaram entrar também cães, acompanhantes de treinadores de cães para cegos e de pessoas sem qualquer dificuldade visual. A referência era sempre outros países onde é permitido os animais de estimação entrarem em qualquer lugar.
Ainda havia também aqueles que, descontentes com a situação atual do país, comentavam baixinho "É em sítios como este, museus e fundações, que o nosso dinheiro está todo enterrado." Depois de visitar todo o museu já se mostravam muito interessados, mas não contrariando o que disseram anteriormente.
Alguns visitantes com a idade mais avançada, na sala dos ofícios, diziam muito orgulhosos que os objetos que ali estão expostos já são mais modernos do que os que os pais deles utilizavam e eles ainda conheceram. Ao ponto de uma senhora da Feira, vizinha do museu, oferecer o material que tem guardado em casa, dos tempos em que os seus avós e pais tinham ofícios.
A sala do antigo tribunal era também motivo de muito falatório, sendo várias as pessoas a questionarem a qualidade da justiça de antigamente em comparação com a atual.
Os jovens centravam mais a atenção na sala que tinha ecrãs táteis com música para ouvir. Os pais e avós ficavam a olhar desconfiados para os movimentos automáticos dos dedos dos mais novos nos ecrãs e só utilizavam o aparelho depois de reforçarmos que podiam utilizar sem vigilância e acompanhamento.
Alguns gostavam tanto do que viam, associando à sua experiência de vida, valorizando o esforço do museu manter presente dados da história que deveriam ter sempre valor, oferecendo até no final 5€ para ajudar o museu a manter e melhorar ainda mais.
Histórias de namoros a começar nas peças de tecelagem, cortejos estudantis em Coimbra, apelidos de "cacos e caquinhos" a peças da pré-história.
Netos a ensinar alguns aspetos da história aos avós que não frequentaram muitos anos escolares, avós a explicarem os ofícios que já não estão na moda, professores a questionar fases da história, perguntando e debatendo.
Claro que o Acordo Ortográfico também foi tema de galhofa, pois apareceram alguns visitantes que repararam que nada no museu está escrito com o novo AO dizendo até "Está tudo cheio de erros. Sem AO não devia ser apresentado ao público." e rindo.
Sabia bem quando saiam contentes dizendo "Que engraçado... Foi preciso vir à Feira para ver um museu tão bonito" ou "Agora vão vocês a Guimarães visitar o nosso" ou "Este museu está de parabéns. Parece que concorre com o de Penafiel que está fechado pois foi considerado o melhor museu pela ONU e aguarda ordens para reabrir."
E sabia também bem quando os mais novos corrigiam situações como a mãe dizer "Olha, isto é o pinheiro!" quando via uma fotografia de um senhor a tirar cortiça da árvore, e o filho logo exclamava "Não, é o sobreiro, pois é ele que dá a cortiça."
A cortiça foi motivo de falatório para muitos visitantes, como um brasileir que me questionou  "A árvore que dá a cortiça é a corticeira?"
A conclusão a que cheguei depois desta semana a conversar com várias pessoas de diferentes idades e origens, foi que muito há a conhecer e aprender com os antepassados, com os de hoje e com os que ainda virão.
Vale a pena pesquisar o que o nosso país tem para oferecer de cultura, pois a grande maioria é de baixo custo ou gratuito. Como algumas senhoras mais idosas disseram "Moro mesmo aqui ao lado e não sabia que tinha um museu tão bonito aqui..."
Boas visitas por Portugal!

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