sábado, 7 de maio de 2011

Lago Niassa

Recolha das redes de pesca
Lavagem de roupa, louça e corpo
Brincadeiras
Pesca
Porquê um post com todas estas fotografias do Lago e seus habitantes?
Porque me deixou numa dimensão muito diferente da qual eu conhecia até então.
Sem barulho de qualquer tipo de máquinas, sem qualquer contato com o resto do mundo e suas notícias, estas pessoas crescem e sobrevivem com o que nós chamariamos de qualidade de vida.
Alimentação feita com alimentos saudáveis, mas essa mesma alimentação nada equilibrada segundo o conceito que estamos habituados.
Higiene diária, mas feita na água do lago, onde se pesca, toma banho, lava a louça e a roupa.
Estar de biquini no local das rotinas diárias desta gente deixou-me com uma sensação que não consigo descrever.
Ver as crianças horas e horas na bricandeira com a água, sem qualquer preocupação aparente, só me fazia associar o seu futuro também a essa mesma água, onde iriam pescar.
Devo confessar que o primeiro passeio ao lago foi o primeiro choque, parecia que estava a entrar num documentário da National Geografic. Fez-me sentir pequenina e leiga perante os homens dentro das canoas feitas de tronco, perante a nudez das pessoas ao tomar banho com sabão onde eu pretendia banhar-me como se estivesse nas nossas praias.
Eu tive o privilégio de conhecer este local onde habitam pessoas que não percebem português pois o dialeto é o nyanja, onde a época colonial deixou pouquíssimas marcas.
Estas marcas são apenas um complexo escolar, alfândega e pouco mais.
Com forte influência do Malawi, algumas pessoas falam inglês e há alguns locais de pernoita para qualquer turista que se aventure em ir até ao extremo esquerdo da província do Niassa.
Como o Lago Niassa é enorme, convém dizer que estas fotografias foram tiradas na Praia de Chuanga, perto da vila de Metangula.
O peixe que aqui se pesca tem o nome de chambo, um peixe preto que abunda por estas águas.
As pessoas fazem os cerca de 115 km até Lichinga para venderem este peixe. Mas não têm a conhecida arca frigorífica... Têm bicicletas com cestos de verga onde colocam o peixe depois de seco.
Talvez pareça muito repetitiva, mas do que adiantará a estes habitantes que aqui querem (e devem) permanecer, estudar até um nível secundário?
Estarão estas pessoas contentes com as novas tecnologias que vão aparecendo?
É muito complicado responder a estas questões...
No caminho para o lago podemos observar casas (algumas palhotas) com paineis solares para que haja eletricidade. Aqui as vantagens são evidentes, pois estamos a falar de centenas de km sem cabos de eletricidade.
Vemos também várias paredes com publicidade à vodacom e mcel, as duas operadoras de telemóveis de Moçambique. Isto acontece porque a maioria das pessoas tem telemóvel... Para quê? A resposta é idêntica se fizermos esta pergunta em Portugal. A diferença é que em Portugal o telemóvel foi substituir o telefone fixo e aqui este é o primeiro meio de comunicação que chega a todos, pois até então apenas algumas aldeias e apenas algumas casas dessas aldeias tinham telefone fixo.
Quando passeamos por estes lados, conhecendo minimamente a história que relaciona Portugal a alguns países africanos, a mente entra em contato com sentidos que baralham... As questões frequentes são: porque viemos (povo português e civilização) aqui parar? Sabem estas pessoas lidar com o progresso? A solução por eles encontrada foi pertinente (ainda vemos casas meio destruídas, pois foram abandonadas pelos brancos)?
Ouvir as histórias de quem aqui estava entre 1975 e 1985 (e até mais tarde), ainda nos faz mais pequeninos perante o horror animalesco e selvagem que paira pelo ar e pelos olhares de alguns.
Olhar para a catana não será a mesma coisa... Se eles soubessem a riqueza que têm, a beleza que têm, talvez a catana não tivesse servido para cortar pessoas apenas porque alguém lhes disse que não deveriam gostar delas...
Muito fica por dizer, muitas pessoas se calam quando numa conversa somos encaminhados para temas como Renamo e Frelimo... E quase todas elas vão lá dar...
Estamos no ano 2011, mas há 30 anos passou-se aqui algo horrível que ofusca a beleza da terra para quem aqui passa mais do que umas férias e para quem pensa sobre isto...
Se calhar eles têm razão em não pensar e apenas viver o presente esquecendo que amanhã também é dia... Hoje têm a fome saciada, não foram violentados, está tudo bem.
Há atrasos em algum procedimento burocrático do que quer que seja? "Há-de vir... É o sistema. Vamos esperar."
E assim a vida continua, aparentemente sem stress, mas com muito medo no ar.

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